Editor: Fernando Albuquerque Marques
Colaboração: Henrique Crena Martins
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GUINÉ
Maldita guiné traiçoeira quanto nos fazes sofrer...
Quantas vidas queimadas para te podermos erguer
Exiges sangue, sacrifício,
És impiedosa até na dor.
No fim, que resta de ti ?
Terás ainda, para dar, amor ?
Calor insuportável, suportável, barulho ensurdecedor, qu'enlouquece,
Sangue que corre pela causa, entusiasmo que aos poucos esmorece.
Sonhos desfeitos com um progétil, vida ceifada por um matraquear.
Almas que em tempos eram vidas, só sabem agora, o verbo matar.
Almas fracas, corpos exaustos, rostos ao sol, pernas ao ar.
Mãos à arma, mãos à cara, coração de lado, vamos matar !
Furriel Branco GUINÉ1969/71 (Do Jornal da CART. 2521 "LENÇOS VERMELHOS")
AO PASSAR POR BISSAU
Ai que raiva de vê-los,
mão em mão
pisando serenos
ruas embelezadas
respirando ares amenos
abrindo o coração
para suas amadas.
Ai que raiva, lampejo de ódio,
vê-los passear em seus passos vagarosos
parecendo dançar
e cantar dós harmoniosos.
...e no cinema, cabeças unidas vendo as imagens...
que ideias pervertidas
passam fugazmente
pela minha cabeça já doente,
cansada de saudade, da guerra sem piedade,
que desabou em quem nunca matou
Furriel Branco (GUINÉ 1969/71)
RECORDAÇÃO DO H.M. 241 (Quando do meu internamento)
Eu vi-o chegar,
quando apanhava a frescura matinal,
Cá de cima, do terraço do 2º andar.
Levantando pó e corpos em descanso,
o heli, docemente, assentou no chão.
A sineta tocou !
Homens correm de maca na mão !
A porta abriu-se de empurrão.
É branco, é preto? interrogação !
O homen de bata branca e bisturi
correu de luvas na mão.
Pareceu-me preto, mas não.
A pele queimada
em momento de precipitação
Levantou a questão:
E se fosse preto?
Não era uma vida humana
acabada em frustação?
Não andou a teu lado
lutando com abnegação?
Palidez no rosto,
Sorriso nos lábios
Mostrando gosto,
Por contribuir Para a Guiné melhor
Que há-de surgir
Furriel Branco Guiné 21.MARÇO.1970)
EMBOSCADA
Era noite
e era dia; Havia sol,
havia sombras,
havia raiva de tanto padecer;
Havia ódio nos olhares...
Que mais havia?
Haveria mais?...
Creio que o ódio tudo enchia e para mais nada lugar havia.
Um pouco à frente era a mata;
Era o desconhecido, conhecido!
...e fomos para a frente como cegos.
Barulho infernal,
silêncio mortal!
Todo o ódio convertido em mortes
ali estava espalhado.
Então ELE deu-nos olhos
e todo coração se sentiu humilhado.
A noite foi-se num ápice
e ficou um claro dia.
À nossa volta tudo quedara.
Partimos. Nada mais havia;
Nem medo, nem raiva, nem ódio;
Apenas triste melancolia,
Corpos que outrora foram gente
Jaziam aos bichos, por ordem d'algum demente...
Furriel Branco Guiné - 1970
TROPA CHICA
Petralhada !
Cor que mata, cor do nada !
Cambada de Inuteis,
Como grandes chefes brancos,
De cujos cerebros mancos
Só saem ideias futeis.
Falhados !
É de ter pena, é de lamentar
Estes seres que não sabem mandar.
Nem homens são, pois andam a se enganar
- em que acreditais ó burros ?
- no poder dos vossos urros ?
- na voz forte de comando
ou nos outros do vosso bando ?
e o soldado, já pronto, sauda aquele tonto
que apenas para humilhar
nem lhe deita o seu olhar.
É a personalidade ombral;
É o complexo de inferioridade;
É o senhor comandante de tal,
É o homen sem personalidade !
- Criasteis o mundo da ilusão.
Aí ficareis na roda dela
Entre cada comissão
Apagai o cio à cadela.
Cambada de estupidos
Doidos e tontos
Que no ombro ostentam a personalidade,
Coitados de vós, ó sonsos !
Coitados !
Infância mal conduzida ?
Desejo de nada fazer ?
Entrega à pátria da vida
Ou a ânsia de sofrer ?
Não !
A cor doirada dos ombros
Os foi conduzindo ao que são:
Animais que andam aos tombos
Que falam de justiça em vão.
E vamos nós "Prontos" heroicos
Sacrificar o amor, a saúde, a vida
Conduzidos por paranoicos
Cuja causa sabem perdida
Furriel Branco - Guiné 1970